Os ciclos reais e a retomada do Brasil

Publicado no Jornal Diário de Uberlândia em 31/03/2018

O artigo de hoje tem por objetivo interpretar a economia brasileira, segundo uma abordagem moderna da pesquisa em macroeconomia. A tentativa é ambiciosa, pois os detalhes que envolvem uma economia de Ciclos Reais são bastante densos e impossíveis de sintetizar em poucos parágrafos. No entanto, é possível observar as diretrizes mais gerais dos modelos RBC (Real Business Cicles) fundada como agenda de pesquisa na passagem dos anos 1970 para os 1980, pelos professores Finn Kydland e Edward Prescot[1], e aplica-las para a economia brasileira.

A característica principal dos RBCs, é o estudo do comportamento da economia no longo prazo, a partir de choques sofridos pelo lado da oferta agregada OA, e o interesse exclusivo no comportamento do lado real da economia (desconsiderando-se o mercado monerário). Dito que o interesse do RBC é o comportamento de longo prazo da economia a partir de um choque, segundo esta abordagem, pouco importa se o crescimento econômico de 2018 será de 2%, 2,5% ou 3%, que configuram meramente o comportamento de curto prazo da economia. Mas sim, cabe debruçar quanto do crescimento de 2018 será carregado para os anos seguintes?

O estudo do comportamento de longo prazo pelos RBCs, consiste num notável avanço em relação aos modelos tradicionais que se debruçam sobre isto, tais como Sollow, Ramsey e Diamond. Uma vez que tais modelos, se preocupam exclusivamente com a elaboração e a explicação de uma tendência de longo prazo para o comportamento da economia. Enquanto que nos RBCs, se estuda como choques aleatórios pelo lado da oferta, podem desviar a economia desta tendência de longo prazo (criando um ciclo de curto prazo) e, qual a persistência deste ciclo ao longo do tempo.

Compreender a persistência de um ciclo de curto prazo e sua influência sobre a tendência de longo prazo das economias, demanda a compreensão das naturezas dos choques: i) Choques tecnológicos, motivados pelo deslocamento da fronteira científica criando inovações para as quais é elevada a produtividade geral da economia. ii) Choques de capital, motivadas a partir de um padrão institucional que altere as propensões microeconômicas de consumir e poupar, no sentido que, maiores taxas de poupança, financiam investimentos que elevam o estoque de capital desta economia e, iii) Choques fiscais, que se expansionistas e focados em despesas de capital do governo, levariam a um crescimento econômico.

Dado este arcabouço teórico, descrevendo de forma resumida uma economia segundo os RBCs, é importante qualificar uma questão de natureza da observação empírica. Em geral, choques tecnológicos apresentam maior e mais persistente expansão do produto em relação aos choques fiscais. Traduzindo em um vocabulário mais simples, quando a política pública é capaz de criar um ambiente institucional, que favoreça a ciência e consequentemente a produtividade, os impactos disto sobre o crescimento são mais evidentes e prolongados. O caso oposto é igualmente verdade, se as instituições do país estão organizadas de forma a dificultar a inovação e a produtividade, e a política pública vigente produz déficits fiscais a partir de despesas públicas desnecessárias, a capacidade de crescimento de longo prazo nesta economia estará bastante prejudicada.

Agora vamos ao caso do Brasil, que passou por um conjunto de choques a partir de 2014, e viu sua economia mergulhar no maior e mais longo ciclo recessivo da sua história, com 7% de queda acumulada no produto e quase 10% de retração da renda per capita. A pergunta é, qual a proporção desta crise de 2014 – 17 o Brasil levará para a próxima década? O potencial de crescimento da economia brasileira foi nos últimos 30 anos, próximo de 2,3% ao ano. Na década em curso, já com os dados de 2017, esta média de crescimento está sendo próxima de 0%. Isto significa que o potencial de crescimento da economia brasileira, que já era baixo, está ainda mais prejudicado, e que a recuperação econômica em curso, ancorada em choques positivos de safras agrícolas pelo lado da oferta e, por um choque monetário jamais visto no país (com redução de juros e compulsórios) irá se restringir ao curto prazo e, na melhor das hipóteses na ausência de novas crises, taxas médias de crescimento medíocres serão nosso destino inevitável.

[1] Vencedores do Nobel de Economia pelas contribuições dos RBC na abordagem macroeconômica de fronteira do conhecimento.

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